“A vida é aquilo que acontece enquanto estás ocupado a fazer outros planos.”

John Lennon

Ensinaram-nos a fazer planos. E se alguns de nós reproduzem esses ensinamentos continuamente, outros raramente o fazem. Existe, no entanto, uma ocasião, em que invariavelmente, todos colocamos em prática esse ensinamento básico que os nossos pais, a escola, as empresas e a sociedade em geral nos incutem: quando descobrimos ou nos informam que vamos ser pais. É como se finalmente a vida ganhasse sentido. Começamos a fazer planos. Como que inadvertidamente, ou por não saberem, esqueceram-se de nos ensinar a diferença entre fazer planos e planear. Quando passamos por essa experiência única nas nossas vidas fazemos planos, a maior parte das vezes não são os nossos planos, mas os do filho que está para nascer. A partir do momento que escolhemos o seu nome, ganha personalidade dentro de nós e o seu futuro começa a ser delineado. Vamos protegê-lo o melhor que sabemos para que esse futuro se possa realizar. Nem pensamos que esse ser tem a sua autonomia e com certeza irá querer escolher o seu próprio futuro. Nós que cá estamos sabemos exactamente o que ele vai precisar e querer, pois os nossos planos incluem acima de tudo a sua felicidade e projectamos nele todas as condições que não tivemos e que são essenciais para que seja bem-sucedido. Esquecemo-nos claramente de um pormenor: a natureza não faz nada em linhas direitas e nem em ângulos rectos, tudo é curvo e indirecto. A nossa mente e o nosso pensamento é lógico e directo e isso não tem nada a ver com a natureza. Sendo nós e a nossa vida parte da natureza é perfeitamente natural que as suas leis sejam aquelas que prevalecem. Esperarmos que os nossos planos lógicos e lineares se concretizem dessa forma, significa que não compreendemos a natureza e as suas leis, entramos no mundo ilusório criado por nós que nunca se concretiza, ou quando se concretiza tem consequências. É perfeitamente natural que o filho defraude os planos dos seus pais, ou então, ver-se-á durante toda a sua vida enclausurado numa estrutura que só lhe traz angústia e sofrimento, apesar de algumas vezes até conseguir ser feliz, mas é uma felicidade mascarada de resignação, apenas por medo de sair daquelas grades e caminhar no lado de fora das fronteiras delineadas pelos seus progenitores.

Ser pai ou mãe não é uma tarefa fácil e obriga acima de tudo a eliminar expectativas e aceitar a bênção da vinda de um ser que tem a sua própria autonomia, vontades e desejos, e que espera que nós o ensinemos a descobrir-se, criemos as condições para que ele desenvolva a sua própria opinião de si, eliminar protecções exageradas e sem sentido, acima de tudo mostrar-lhe a amplitude da vida em vez das suas restrições.

A vida actual é quase sem sentido. Quando perguntamos aos nossos filhos o que querem ser, na realidade eles sentem-se perdidos sem saberem muito bem o que responder. Incutimos quase sem nos apercebermos, ou mesmo de forma directa, que tem de ganhar dinheiro e isso parece ser incompatível com o que eles querem, que é serem felizes.

A religião global instituída no planeta tem por trás um único Deus, o Dinheiro, e acreditamos que só podemos ser felizes perto dele ou a caminhar na sua direcção. Lembro-me da história de John Lennon, quando na escola o professor perguntou o que os alunos da turma queriam ser quando crescessem. Claro que os seus colegas de turma responderam o tradicional: contabilista, engenheiro, médico, professor, etc., e quando ele responde que queria ser feliz, é-lhe devolvido que ele não tinha entendido a pergunta, ao que ele responde que o professor não entendia a vida. Quando lemos esta história todos concordamos com o John Lennon, e apesar de parecer um pouco sonhador, sabemos que é o caminho correcto. Como colocar isto na prática? No caso do JL, a sua mãe sempre lhe disse desde pequeno, que a felicidade era a chave para a vida. As mães ou os pais dos restantes alunos da turma, mostravam, possivelmente, como todos nós fazemos, que sem dinheiro não existe felicidade. Fizemos planos e preparamos os nossos filhos para serem servos do dinheiro.

Na vida podemos ser o que quisermos e seja aquilo que façamos devemos ter orgulho nisso e podemos até não ser os melhores, mas devemos esforçar-nos continuamente para sermos bons naquilo que fazemos. Esta atitude obriga a trabalho e melhoramento contínuos e se fizermos aquilo que gostarmos, criarmos valor adicional ajudando outras pessoas e procurarmos acima de tudo sermos felizes, garanto-vos que a chave para a vida será encontrada.

Se olharmos para o mundo empresarial, nenhuma companhia é bem-sucedida durante muito tempo quando o seu interesse é fazer dinheiro pelo dinheiro. As companhias que são bem-sucedidas criam valor e esse valor deriva de ajudar as pessoas, criando serviços úteis. Quando alguém quer apenas fazer dinheiro por fazer dinheiro, fica cego por isso e esquece aquilo que é mais importante: ajudar pessoas através da criação de valor adicional.

O modo como se faz a gestão do Eu, duma vida, duma família, duma empresa, duma nação, dum povo é o mesmo. O que diferencia as empresas, tal como o que diferencia os povos são as suas culturas. Nós não somos diferentes quando consideramos uma família. Qual a cultura dessa família? Quais os seus valores? Quais os seus hábitos? Quais as suas tradições? Qual a sua alimentação? Tudo isso faz parte da cultura de uma família e que é transmitida para os filhos através da vivência diária. Os valores culturais são aqueles que perduram no tempo e são transmitidos de geração em geração.

O que temos transmitido aos nossos filhos é a acção directa: tenho tosse tomo algo para a tosse, se estou a chorar tenho de parar de chorar, se tenho febre tenho de fazer passar a febre, se tenho dor tenho de eliminar a dor, se tiro más notas entro para uma explicadora para tirar melhores notas, ou tenho de estudar mais, se não tenho nada para fazer, entedio-me e preciso de me ocupar com algo imediatamente, pois corro o risco de entrar em contacto comigo, o que seria um enorme desperdício de tempo. Ocupo assim o meu tempo com actividades que não trazem qualquer valor adicional, nem para mim, nem para ninguém, para além do dinheiro gasto e do passar do tempo. Ou seja, se existe algo que me cria desconforto ou que os resultados não são os que espero, tenho de imediatamente eliminar ou aliviar esse desconforto, ou fazer algo para contrariar a tendência dos resultados.

Este é o pensamento linear do ser humano e que nos têm vindo a transmitir ao longo de séculos. Esta é a nossa cultura. Estamos concentrados no imediatismo e nos resultados instantâneos. Fazemos planos lineares e lógicos para conseguir atingir resultados, como se a vida fosse tão linear como a construção de um edifício, em que sabemos exactamente aquilo que queremos. Temos o projecto e planeamos e delineamos a forma de colocarmos esse edifício até ao pormenor. A questão é que nós não chegamos aqui com um projecto de vida previamente definido, este é definido e construído à medida que vivemos. Quando definimos o projecto, a maior parte das vezes percebemos que não era por ali. Isso mostra claramente que não seremos bem-sucedidos se tentamos viver a vida de forma linear quando ela é totalmente indirecta. Ao ensinarmos os nossos filhos a terem uma visão linear da vida geramos adultos desiludidos e perdidos sem saberem o que estão cá a fazer, vivendo o seu dia-a-dia ocupados a trabalhar, proteger os filhos, dormir, comer, ir às compras, parados no sofá a olhar para a televisão e a terem férias dessa rotina 30 dias por ano para poderem voltar novamente à mesma rotina que irá durar até ao dia da reforma, que na maior parte das vezes, é o primeiro dia da preparação para a despedida do planeta. Chegamos ao final sem projecto nem construção que se possa mostrar. Nuns casos acreditamos que valeu a pena porque os nossos filhos vão conseguir e noutros, nem nos filhos podem confiar para que isso aconteça. Este tipo de vida repete-se de geração em geração sem conseguirmos fugir dela.

Para mudar este panorama temos de começar a ensinar aos nossos filhos o pensamento indirecto e o significado da felicidade. A maior parte das vezes são os acidentes que nos trazem os maiores proveitos em vez do plano pormenorizadamente delineado. Os planos fazem-se para serem continuamente rasgados e têm um objectivo primordial: obrigar-nos a deslocar-nos. Então em vez de planos vamos planear direcções e vamos começar a aproximar-nos dessas direcções. Viver é aprender e aprender é cair continuamente. Então o sucesso não é o nosso objectivo maior e sim a aprendizagem continua e o aprender continuamente a fazer melhor. Os planos se existirem, devem ser de curto prazo e apenas para nos guiarem no momento. Planear direcções serve para nos deslocarmos e o plano serve apenas de apoio, como se fossem as rodinhas quando tentamos aprender a andar de bicicleta.

As maiores descobertas da humanidade aconteceram por acaso, o que respeita integralmente as leis da natureza. Então para mudarmos a situação actual temos de perceber como a natureza funciona e o que a diferencia do funcionamento humano.

A natureza nunca se movimenta em linhas rectas. O pensamento lógico humano sim. A melhor forma de aprender a fazer algo que nunca fizemos antes é escolhermos um modelo e tentar no princípio imitá-lo, para depois ampliarmos as nossas capacidades para além do modelo escolhido. Ao copiarmos a natureza temos de entender as suas capacidades e as diferenças para aquilo que somos.

A natureza gera a ordem perfeita a partir do caos, o homem gera o caos perfeito a partir da ordem.

A natureza é uma pensadora e executante indirecta, ou seja, nunca usa linhas rectas, e ela é mesmo boa a fazer isso.

Como nós fazemos parte da natureza, não nos podemos afastar dessa lei. Tentar fazer tudo em linhas direitas é não entender a lei e claro, não traz exactamente aquilo que pretendemos.

Se queremos deixar uma geração melhor para o planeta então temos de começar a ensinar modos diferentes de pensamento.

A primeira mudança está relacionada com a perspectiva que nós temos do tempo e de quem acreditamos que somos, ou seja, a ilusão que nós temos de nós próprios. Reportamo-nos a identificar quem somos pelos feitos e trajectos do passado. Em vez disso podemos começar a identificar no que nos queremos tornar, a percepcionar a diferença entre o que somos actualmente e o que queremos ser e começar a trabalhar para diminuir a distância entre esses dois eus, ou seja, deixarmos de nos reportar por aquilo que já fizemos, que são coisas do passado, para avaliarmos o momento presente e definirmos o que vamos ser no futuro e começar a escavar a distância que separa o eu actual do eu que eu me quero tornar. O mundo inteiro é um palco e nós somos meros actores, mas somos actores especiais e temos direito a escrever o nosso argumento, a realizar o nosso próprio filme e a desempenharmos o papel que decidirmos desempenhar.

A segunda mudança está relacionada com uma questão de entendimento do relacionamento com o meio envolvente. Tudo é um espelho, tudo se reflecte em tudo. Assim tudo aquilo que eu faço reflecte aquilo que eu sou. As pessoas que circulam ao meu redor e as suas manifestações e comportamentos reflectem aquilo que eu sou. Então se eu não sei quem realmente sou e não tenho consciência dos meus comportamentos, só preciso olhar para o mundo à minha volta e isso vai dizer-me o que preciso de mudar. Para os pais que não estão satisfeitos com alguns dos comportamentos dos filhos, não precisam de stressar com os filhos, precisam antes de mudar esse comportamento dentro deles, pois os filhos mostram-nos o que precisamos de mudar.

A terceira mudança refere-se ao padrão que aceitamos como confortável. Regulamo-nos normalmente por duas linhas: a linha do conforto e a linha do pânico. Enquanto o que estiver a acontecer estiver dentro da linha do conforto, fazemos e investimos sempre muito pouco. Quando essa linha é ultrapassada na direcção inferior, começamos a mexer-nos, mas só começamos mesmo a fazer algo quando atingimos a linha de pânico, ou seja, quando entramos numa situação limite. Esquecemos facilmente os nossos sonhos e trabalhamos até estarmos acima da linha de conforto e mantemo-nos a fazer o que fazemos de modo a garantir que não baixamos da linha de conforto. O padrão que devemos escolher são os nossos sonhos e devemos trabalhar sempre na direcção de os atingirmos, não existe nem uma linha de conforto, nem uma linha de pânico e estaremos sempre a desenvolver-nos no sentido de criarmos o nosso mais elevado padrão e a diverti-nos ao fazê-lo. Nenhum recordista do mundo relata que a única coisa que lhe interessava era bater o recorde do mundo, o que normalmente testemunham é o prazer que tinham em treinar todos os dias e em competir com eles próprios.

Ser pai ou mãe de alguém requer acima de tudo consciência de quem nos queremos tornar e investir nesse sentido, os filhos vão ser os nossos espelhos. Se esquecemos facilmente os nossos sonhos escusamos de projectá-los nos nossos filhos, pois eles vão fazer o mesmo com os filhos deles e assim por diante até ao infinito. Se queremos que os nossos filhos sejam felizes, temos de perseguir os nossos sonhos e desenvolvermos um padrão elevado de nós. Eles irão reflectir essa forma de estar na vida, entender que a vida, para além de uma viagem sem fim, é cheia de curvas e contracurvas infinitas e que o pensamento linear é uma ilusão projectada da nossa mente, não reflectindo de modo nenhum a realidade. As paragens da vida apenas servem para decidirmos se queremos continuar a mesma viagem ou mudar a viagem. Quando aceitamos a lei da natureza e trabalhamos de forma indirecta, então nas paragens vamos ter todas as possíveis viagens disponíveis naquele momento, para cada um de nós, e só temos de escolher, sabendo de antemão que as viagens são sem fim e, ou ficamos parados na estação à espera do comboio que planeámos, ou viajamos em círculos, ou vamos até ao infinito experienciando todas as curvas que precisamos.